O planejamento patrimonial sucessório, amplamente adotado por famílias e empresários, consiste na estratégica alocação de ativos, com foco principal em: (i) proteção patrimonial, (ii) redução de obrigações fiscais e/ou (iii) organização e transmissão da riqueza para as gerações futuras.
Profissionais especializados nesta área empregam uma variedade de ferramentas legais e econômicas para executar um planejamento patrimonial eficaz, que abrange desde a elaboração de um simples testamento ou doação direta de bens até a criação de fundos de investimento privados, estruturas offshore e holdings (sociedades patrimoniais).
Neste artigo, abordaremos especificamente o uso da holding como uma ferramenta de planejamento patrimonial e sucessório. Discutiremos os custos associados, precauções necessárias e desenvolvimentos recentes relacionados ao tema.
Uma holding é geralmente estabelecida da seguinte forma: (a) criação de uma sociedade empresarial, frequentemente uma sociedade de responsabilidade limitada, cujos sócios são membros de uma família nuclear (e outros, quando apropriado); (b) transferência de ativos, sejam eles tangíveis ou intangíveis, móveis ou imóveis, para o patrimônio da holding; (c) estabelecimento de uma estrutura de governança societária para preservar o controle patrimonial e político por um determinado sócio, conforme necessário; e (d) transferência, ao longo do tempo ou imediatamente, das participações dos sócios para outros (geralmente dos pais para os filhos ou herdeiros legais), com o intuito de transferir virtualmente o patrimônio contido na holding.
Durante o processo de planejamento (itens “b” e “d” acima mencionados), surgem dois tributos potenciais: o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI – imposto municipal) e o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD – imposto estadual).
O ITBI, em termos gerais, é aplicado quando alguém transfere um bem imóvel para o patrimônio de outra pessoa por meio da integralização de capital na holding.
Já o ITCD (ITCMD) é aplicado quando alguém transmite um bem, seja móvel ou imóvel, por meio de doação ou herança para outra pessoa. No contexto da holding, o ITCD ocorre quando um dos sócios doa suas quotas ou parte delas a outro.
No entanto, na prática, muitas municipalidades cobram o ITBI de maneira irregular e obrigatória, mesmo quando a Constituição Federal expressamente proíbe essa cobrança. Os municípios alegam que a pessoa jurídica receptora do imóvel tem uma atividade predominantemente imobiliária, simplesmente com base na descrição do objeto ou CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) relacionados à propriedade imobiliária, usando a parte final do inciso I, §2 do artigo 156 como justificativa.
Além disso, após o julgamento do Tema 796 pelo Supremo Tribunal Federal, que se concentrou em um caso específico de alocação de bens em reserva de capital, os municípios aproveitaram para cobrar o ITBI sobre a diferença entre o valor declarado do imóvel (geralmente com base no valor histórico) e seu valor de mercado, em casos de integralização de capital na holding.
Isso demonstra uma falta de compreensão da disposição constitucional por parte das autoridades tributárias, que estabelece limites à tributação no contexto do planejamento patrimonial por meio de holdings, resultando em uma carga tributária mais alta devido à incidência do ITBI.
No entanto, contribuintes, assessorados por profissionais especializados, começaram a questionar a constitucionalidade dessa cobrança, argumentando que:
(i) A decisão no Tema 796 não se aplica aos casos comuns de integralização de imóveis em uma pessoa jurídica (holding), pois o caso do Tema envolveu uma situação específica de alocação de sobrevalor em reserva de capital.
(ii) A atividade imobiliária, conforme a última parte do inciso I, §2º, do artigo 156 da CF, não deve ser automaticamente considerada com base na descrição do objeto ou CNAE da sociedade, mas sim de acordo com as regras do Código Tributário Nacional.
(iii) A incidência do ITBI só deve ocorrer nos casos de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, e mesmo assim, somente se a atividade preponderante for imobiliária, deixando de fora todos os outros casos de integralização de capital com imóveis, que seriam imunes de acordo com a estrutura gramatical/semântica do inciso em questão.
Dessa forma, o presente artigo discute o ponto (iii) em detalhes, enfatizando a imunidade incondicional do ITBI nos casos de integralização de imóveis no patrimônio de uma pessoa jurídica.
É importante ressaltar que esse novo entendimento, favorável aos contribuintes, reforça os termos da Constituição e promove o planejamento patrimonial por meio de holdings, evitando uma tributação irracional por parte das autoridades municipais. Além disso, um julgamento importante do Tribunal de Justiça do Distrito Federal abre caminho para que essa questão seja levada ao Supremo Tribunal Federal, proporcionando a oportunidade de um esclarecimento direto sobre o assunto, ao contrário do que aconteceu no caso do Tema 796.