O Órgão Especial do Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento finalizada recentemente, reputou inconstitucional a incidência do ICMS sobre bens e mercadorias digitais, afastando, assim, as alterações introduzidas pela Lei N°8.795/2020.
O ponto central abordado pelo STJ, nos termos de voto da relatora, Desembargadora Leila Albuquerque, foi a atribuição ou não, da qualidade de contribuintes de ICMS aos sites e plataformas eletrônicas que disponibilizem bem ou mercadoria digital, bem como da responsabilidade tributária, dos respectivos adquirentes ou importadores.
O entendimento majoritário da Corte aplicou os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal de 2021, quando os julgamentos das sessões diretas de Inconstitucionalidade nos 1945/MT e 5659/MG, naquela oportunidade, o STF decidiu que o imposto incidente sobre estas operações seria em verdade o ISS. Tal como afirmado pela Suprema Corte, o STJ considerou a dicotomia entre obrigação de dar ou de fazer não é mais suficiente para delimitar a fronteira entre a sujeição do ICMS ou ao ISS. Desta forma, assim como decidido em relação aos softwares, em sendo o caso de relações jurídicas complexas ou híbridas, deve-se privilegiar, a existência do esforço humano, de criação intelectual, para a desenvolvimento e manutenção dos programas digitais.
Além disso, no caso dos serviços de streaming, a hipótese de sujeição ao ISS já foi instituída por meio da Lei Complementar Federal. Logo, pode-se presumir que o legislador resolveu o conflito de competência tributária, optando pela incidência do ISS, e não do ICMS, devendo prevalecer a sua competência legislativa.
A tendência da tributação das operações digitais pelo ISS, entretanto, torna-se mais complexa à medida em que os elementos característicos da prestação de serviço são suprimidos. Nem toda operação digital pode exprimir a existência de um esforço humano direcionado à realização da prestação – prevalência da obrigação de fazer em um contrato complexo.
Nas operações de compra e venda de tokens não fungíveis – NFT (non-funglible token), por exemplo, não se caracteriza como priori qualquer prestação de serviço, mas tão somente a transferência da propriedade de um ativo digital.
Vale relembrar que, de acordo com o art 5º da instrução Normativa RFB 1.888/2019, os NFTs não estariam sujeitos ao ICMS, posto que eles não se amoldariam ao conceito de mercadoria. Neste momento, a presença ainda esparsa de normas regulatórias sobre a natureza dos criptoativos e sua respectiva tributação nos traz uma série de questionamentos, levando ainda a um quadro geral de insegurança.
Como não se pode e não se deve usar analogia na tributação, cria-se grande perplexidade em relação aos ativos digitais. Além de uma evidente incompatibilidade entre as novas formas negociais e normas jurídicas anacrônicas, a tributação por semelhança fatalmente cria uma elasticidade nos conceitos tributários que acaba ferindo o corolário básico da Legalidade Tributária.